quarta-feira, 2 de março de 2011

Uma contradição social
Crônica



Um jovem que indicava não ter nada na vida. E de fato não tinha. De fato nunca teria.

Sandro do Nascimento, o autor de toda a tragédia do ônibus 174, menino de rua, jovem marginalizado, adulto sem perspectivas. Começou a infância presenciando o assassinato da sua mãe a sangue frio, assistindo as facadas sangrentas. Poucos anos depois tornou-se um dos poucos sobreviventes do massacre da Candelária, foi preso diversas vezes... Nunca conseguiu uma vida digna, nunca estudou, nunca teve oportunidades.

Existem muitos Sandros na rua hoje. Basta olhar para o lado que vamos ver um deles lá, implorando um pouco de visibilidade, de vida. Mas não adianta! Eles continuam sendo o lixo da população. Nós fechamos os olhos, ignoramos, os tornamos apenas seres invisíveis.

Acomodados nos nossos apartamentos deixamos que crianças como nossos filhos sejam criados a mercê da miséria, da desgraça. Ignorando sua situação estamos tirando deles o direito de existir com dignidade. E logo vem o nosso consolo “quem luta consegue mudar” ou “ele não quer nada com nada”. Resta a dúvida: já perguntaram para eles se eles estariam ali se tivessem qualquer outra oportunidade? Não. Mas não vem ao caso... O que realmente importa é ter a consciência limpa, viver nossa vidinha medíocre tranquilamente, com as bundas acomodadas no sofá quentinho da nossa sala.

A sociedade capitalista é por si mesma uma contradição social. Por que de acordo com a lei, de acordo com todas as garantias que o governo oferece, não deveriam existir crianças nas ruas. De acordo com essa lei bonita, todas as pessoas – eu disse todas, independente da classe social – deveriam ter acesso a direitos humanos básicos. Isso inclui saúde, isso inclui educação, isso inclui no mínimo um teto para viver.

Basta ver a história como do ônibus 174 para observar as grandes contradições do nosso sistema. O jovem que não teve, não tem e nunca teria acesso a nada “merecia mesmo morrer”. O povo condena a morte de um marginal por considerar violenta sua atitude, mas apóia a polícia na brutalidade de matá-lo a sangue frio.

E é isso que o povo quer... Que “limpem” as ruas, tirem esses lixinhos humanos insignificantes das nossas vistas, para que assim continuemos a levar nossa vida em paz.

Basta saber... Até quando será possível?

Nenhum comentário:

Postar um comentário